Review Multiversal: A Bússola de Ouro (e o final que nunca aconteceu)


Após o grande sucesso da trilogia O Senhor dos Anéis, a New Line Cinema, muito feliz da vida e nadando em dinheiro, apostou que time ganhando não mexe e decidiu produzir uma nova trilogia baseada em livros de fantasia: Fronteiras do Universo, de Philip Pullman, composto por "A Bússola de Ouro", "A Lâmina Sutil" e "A Luneta Âmbar" foi o escolhido. Só existe filme do primeiro. O que aconteceu? Como ele é? Como adapta o livro? Vamos descobrir!

Em um universo paralelo, a jovem Lyra Belacqua viaja para o extremo norte para salvar seu melhor amigo e outras crianças sequestradas de terríveis experiências de uma organização misteriosa. (Sinopse do IMDb)

Pan, o dimon de Lyra, a protagonista.

A Bússola de Ouro é uma empreitada ambiciosa ao explorar o conceito de universos paralelos, em uma história de amadurecimento, responsabilidade e tensões políticas e religiosas. Porém, isso tudo no livro. O filme, apesar de uma bela cena introdutória, faz um excelente trabalho em ser muito confuso e covarde.

Dirigido por Chris Weitz (Formiguinhaz, Um Grande Garoto), o longa marcou a infância de muitas pessoas, mas não a minha. Sempre vi as chamadas no SBT, só que nunca peguei pra ver o filme de fato, não por falta de interesse, sempre me chamou a atenção, apenas nunca deu certo ou nunca lembrei, sei lá. Agora, em pleno 2020, decidi assistir o filme motivado pela leitura do primeiro livro e do lançamento da série da BBC, His Dark Materials, que tem um nome muito maneiro e parece ser uma adaptação mais digna. Ok, então, neste texto não espere por nostalgia da minha parte ou que eu isente o filme comparações com o livro, essas serão indispensáveis para destacar os problemas do filme.

Começando pela narrativa: o roteiro, escrito por Weitz tendo como base o livro de Pullman, é bem fiel ao material original em grande parte, todavia, peca demais em facilitações narrativas e, principalmente, na transferência da tensão política-religiosa e outras temas mais sérios que estão presentes no livro. É injusto dizer que tudo é culpa do roteirista, porque a montagem desse filme é um horror e grande parte por culpa é do estúdio (falaremos disso mais para frente), só que a quantidade de facilitações preguiçosas aqui é espetacular. Fora a completa exclusão da igreja e do totalitarismo imposto por ela, muito presente no material fonte e inexistente durante todo o filme.


Primeiro encontro entre Lyra e Iorek.

No papel, a história de Lyra, Iorek, Senhorita Coulter e Lorde Asriel tem peso, o mundo criado em tela é muito tangível e a presença dos dimons (materialização das almas em forma de animal, muito importante para a narrativa) é parcialmente muito bem feita. O problema real aqui é o desenvolvimento dos personagens e seus arcos narrativos, que são todos apressados, atrapalhados e às vezes impossíveis de entender. Das poucas partes da trama onde dá para entender algo, as mais simples, elas não tem peso, já que nada teve tempo para que ser desenvolvido. 

Quanto ao elenco, é um dos grandes acertos do filme. As escalações são excelentes, mesmo que no produto final pareça um desperdício de talento. Dakota Blue Richards como Lyra, Daniel  "James Bond" Craig como Asriel, Nicole Kidman como Marisa Coulter, Eva Green como Serafina Pekkala... é simplesmente sensacional, os atores e atrizes são representações visuais incríveis e casam muito bem com os personagens.

"Que papo é esse de pó?"

O mundo criado com muita computação gráfica é fiel ao dos livros e belíssimo, os efeitos visuais do filme são lindíssimos para a época e o uso deles nos dimons, que vemos o tempo todo, não incomodam, assim como nos ursos polares. Todas as locações são ótimas, os figurinos lindos e o design de produção é realmente um exemplo de trabalho bem feito. Visualmente, não tem do que reclamar.

Agora voltando a reclamar, preciso falar da montagem e da interferência do estúdio, e aqui tem spoilers! Se não quiser saber de nada com relação ao filme/livro, pule 3 parágrafos e volte depois de assistir/ler! Vamos lá. O livro é dividido em três grandes locações/ arcos, Oxford (universidade, apartamento da Senhorita Coulter e Gípicios), Bolvagnar (viagem ao norte e Estação Experimental) e Svalbard (Reino dos Ursos Polares, prisão do Asriel e final do livro). Ok. O que o filme faz? INVERTE BOLVAGNAR E SVALBARD. Sim! Mandam o final pro meio e o meio pro final! Por quê? Existem algumas teorias e algumas explicações na internet.

O Aletiômetro.

Segundo algumas fontes que trabalharam no filme, após uma exibição teste não ter ido muito bem com o público, o estúdio, New Line Cinema, exigiu algumas alterações no produto. O longa não deveria ter mais de 2 horas e os ursos polares deveriam aparecer antes da metade do filme, pois eles achavam que os ursos vendiam o negócio. A equipe então teve que remontar o filme, cortar diversas cenas e momentos importantes, se virar nos 30, e enfiar algo que deveria estar no final, lá no meio. Neste processo, Roger teve que ser apagado digitalmente de Svalbard, Iorek carregando Lyra pela neve teve que ser redublado e cenas realocadas para terem outro sentido.

Se você acha que já leu ordens sem sentido dadas por estúdios grandes o suficiente, se prepare: nas exibições teste, os executivos acharam que o final gravado (mesmo final do livro), onde Lorde Asriel MATA Roger para abrir um portal para outro universo e o atravessa, enquanto Lyra renega seus pais e deixa o corpo de seu amigo no chão para também seguir em direção a outro universo logo depois, o que terminaria assim em um baita gancho pra continuação, seria um final melancólico demais e poderia confundir algumas pessoas (que nos testes acharam que Lyra tinha ido pro paraíso, pfvr), assim, a New Line decidiu cortar esse final para inseri-lo no começo do possível segundo filme e dar ao primeiro um final mais alegre e esperançoso, com Lyra, as crianças e seus amigos fugindo da Estação Experimental e sonhando com um final feliz e esperançoso ao lado de Asriel. BULLSHIT. Essa cena encerra a segunda parte do livro, ou seja, o terceiro ato do filme. BULLSHIT². 

Saudades do que a gente não viveu.

Pois é, A Bússola de Ouro sofreu muito com essas interferências da New Line Cinema. Uma das provas que existem dessa alteração (que foi feita poucos meses antes do lançamento), é que o jogo de PS2 baseado no filme (quando isso era uma prática comum), segue a mesma ordem de acontecimentos do livro, e, mesmo não contando com as cenas finais, chega muito mais perto do final planejado que o filme. A propósito, uma das cenas "perdidas" do longa pode ser acessada no jogo! E, se você ficou interessado em saber como esse final seria no cinema, o usuário do YouTube Energy UK realocou cenas editadas com clipes de áudio, pegou storyboards e cenas de trailers e material promocional oficial para fazer isso acontecer. O link é esse! E, bem, é incrível que nós provavelmente nunca vejamos essas cenas em boa qualidade e completas, mesmo elas estando todas gravadas e editadas há mais de uma década. Uma pena.

Mesmo com visuais magníficos e um ótimo elenco, A Bússola de Ouro não consegue se salvar de diversos problemas de ritmo, montagem, roteiro e narrativa, que prejudicam a produção, e muito. Todavia, o filme de Chris Weitz tem como álibi o fato de que seu estúdio fez diversas alterações sem sentido que resultaram em seus maiores problemas, o que, ainda assim, não isenta o filme de todos eles. Com o lançamento da série baseada no mesmo material fonte, é praticamente impossível que vejamos um dia a "versão definitiva" do longa, o que é uma pena, tanto para os fãs da obra literária quanto para os fãs de fantasia em geral, já que A Bússola de Ouro esbanjava potencial, que infelizmente amargou em um grande desastre narrativo.

Nota Crítica: 5.5!
Nota Pessoal: 4¡

Pôster oficial do longa.

Inseri algumas imagens a mais desta vez porque esse filme tem realmente ótimos visuais:









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Escrito por Thiago Almeida

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